ARCEBURGO - 11
– 22/07/85 –
Dia
Domingo, dia de sol, a cidade fervilhava com pessoas que iam e vinham. Era uma tarde quente, cinco horas, o bar do Tião abrira há pouco. Não nos importavam as pessoas que passeavam circulando pela praça. Os poucos carros que se deslocavam pareciam distantes. Alheias à nossa vontade as moscas insistiam em nos incomodar voando e zunindo à nossa frente, tocando com suas irritantes patas suaves nosso rosto, ameaçando nossa comida. O movimento do braço levando o copo à boca refletiu-se em meu olhar, com o copo ainda no ar parei ao ver o brilho do dia refletido nos cabelos da bela morena.
Eu e Marcelo passamos a tarde de domingo bebendo e jogando sinuca, olhando as mulheres que desfilavam em suas roupas de domingo e conversando com o Tião. Alguns vizinhos que eu não conhecia nos cumprimentavam e disseram que estavam admirados com nosso trabalho no sítio. Pensavam que não agüentaríamos os dois primeiros dias, ganháramos seu respeito. Aos poucos nos aceitavam no lugarejo.
Provei pela primeira vez em vários dias a sonhada, maravilhosa, apetitosa e desejada carne em um sanduíche delicioso. A fibra se desfazendo entre meus dentes me dava um prazer mais. E o senti mais delicioso ainda por minha fome do que por esmero do chapeiro. A cerveja descia gelada pela garganta embriagando-me aos poucos, suas bolhas geladas acariciando como mil mãozinhas meu palato e parte da garganta a cada gole. A sensação de frescor e satisfação não poderia ser melhor. A cada tacada um gole, a cada gole mais álcool penetrando nas veias, subindo à mente. E assim se foi aquele domingo cálido.
Noite
Visto que por vezes tentávamos fazer daquela vela duas, nos contentávamos com a graça de apenas uma chama. Acendíamos cigarros rituais feitos à mão e sentíamos a vela a queimar no centro do chão da sala tão conhecido e íntimo. Sua luz não trazia nada de novo. E, apesar de tentarmos, não conseguíamos nos comunicar com as forças da natureza.
Ao mesmo tempo em que discerníamos nossas diferenças internas, vagos lumes nos cercavam voando ou correndo ao nosso redor. Os lumes, mesmo que não soubéssemos, não eram capazes de fazer o mal. Faziam apenas aquela dança de rodear até encontrar um par e, em seguida, se apagavam para somente reacender após o clímax copular. Mas esta nova luz era tão diferente que a anterior que os lumes deixavam de ser lumes para ser vagas estrelas refletidas no lago escondido pela mata naquela noite de inverno.
E houve a história de um lume vago, solitário, que a cada noite, verificava, insano, que nada daquilo que não compreendia não significava o que pensava. E, ao parar numa vertente após longo percurso, percebeu que ao seu redor não havia mais que aquilo que poderia sentir. Apoderou-se dele profunda agonia por não saber o que poderia ser a realidade absoluta, a solidão presente na escuridão.
Dia
Domingo, dia de sol, a cidade fervilhava com pessoas que iam e vinham. Era uma tarde quente, cinco horas, o bar do Tião abrira há pouco. Não nos importavam as pessoas que passeavam circulando pela praça. Os poucos carros que se deslocavam pareciam distantes. Alheias à nossa vontade as moscas insistiam em nos incomodar voando e zunindo à nossa frente, tocando com suas irritantes patas suaves nosso rosto, ameaçando nossa comida. O movimento do braço levando o copo à boca refletiu-se em meu olhar, com o copo ainda no ar parei ao ver o brilho do dia refletido nos cabelos da bela morena.
Eu e Marcelo passamos a tarde de domingo bebendo e jogando sinuca, olhando as mulheres que desfilavam em suas roupas de domingo e conversando com o Tião. Alguns vizinhos que eu não conhecia nos cumprimentavam e disseram que estavam admirados com nosso trabalho no sítio. Pensavam que não agüentaríamos os dois primeiros dias, ganháramos seu respeito. Aos poucos nos aceitavam no lugarejo.
Provei pela primeira vez em vários dias a sonhada, maravilhosa, apetitosa e desejada carne em um sanduíche delicioso. A fibra se desfazendo entre meus dentes me dava um prazer mais. E o senti mais delicioso ainda por minha fome do que por esmero do chapeiro. A cerveja descia gelada pela garganta embriagando-me aos poucos, suas bolhas geladas acariciando como mil mãozinhas meu palato e parte da garganta a cada gole. A sensação de frescor e satisfação não poderia ser melhor. A cada tacada um gole, a cada gole mais álcool penetrando nas veias, subindo à mente. E assim se foi aquele domingo cálido.
Noite
Visto que por vezes tentávamos fazer daquela vela duas, nos contentávamos com a graça de apenas uma chama. Acendíamos cigarros rituais feitos à mão e sentíamos a vela a queimar no centro do chão da sala tão conhecido e íntimo. Sua luz não trazia nada de novo. E, apesar de tentarmos, não conseguíamos nos comunicar com as forças da natureza.
Ao mesmo tempo em que discerníamos nossas diferenças internas, vagos lumes nos cercavam voando ou correndo ao nosso redor. Os lumes, mesmo que não soubéssemos, não eram capazes de fazer o mal. Faziam apenas aquela dança de rodear até encontrar um par e, em seguida, se apagavam para somente reacender após o clímax copular. Mas esta nova luz era tão diferente que a anterior que os lumes deixavam de ser lumes para ser vagas estrelas refletidas no lago escondido pela mata naquela noite de inverno.
E houve a história de um lume vago, solitário, que a cada noite, verificava, insano, que nada daquilo que não compreendia não significava o que pensava. E, ao parar numa vertente após longo percurso, percebeu que ao seu redor não havia mais que aquilo que poderia sentir. Apoderou-se dele profunda agonia por não saber o que poderia ser a realidade absoluta, a solidão presente na escuridão.


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